quinta-feira, 11 de abril de 2013

Estudos no Sermão do Monte / parte 20 - Não Resistais ao Perverso 1 – A lei de talião e o ensino de Jesus


NÃO RESISTAIS AO PERVERSO – 1

 

- A lei de talião e o ensino de Jesus -

 

“Ouvistes que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra; e, ao que quer demandar contigo e tirar-te a túnica, deixa-lhe também a capa. Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele duas. Dá a quem te pede e não voltes as costas ao que deseja que lhe emprestes.” (Mateus 5:38-42 RA)

 

01. Diante de nós está uma das leis mais antigas, a lei conhecida por alguns com “lei de talião”, que consiste na rigorosa reciprocidade do crime e da pena; lei expressa pela máxima “olho por olho e dente por dente”, a lei que prescreve a pena que é denominada por alguns de “castigo-espelho”, isto é, castigo ou punição exatamente igual a crime.

02. E também diante de nós está o ensino do Senhor Jesus.

03. Qual o propósito dessa lei na legislação mosaica? Qual era a interpretação dos escribas e fariseus? (interpretação errada, posto que Jesus demonstra isso em sua palavra em parte contra os ensinos deles). E em que consiste o ensino de Jesus?

04. Vamos pensar um pouquinho nestas questões, começando pelo intuito da legislação Mosaica.

 

I. O intuito da legislação Mosaica

 

01. Para quem não tem conhecimento da parte da legislação Mosaica que sentencia “olho por olho e dente por dente”, cito os textos: Êxodo 21.24, Levítico 24.20 e Deuteronômio 19.21.

02. Creio que já tivemos ocasião, em dos estudos passados, de mencionar ligeiramente o intuito da legislação mosaica no que respeita a essa questão.

03. O principal intuito, segundo entendimento de diversos estudiosos/teólogos, era o de controlar excessos; controlar a ira a violência e a vingança. Constituía-se, portanto, em um principio regulador dentro da sociedade em desenvolvimento naquela época. Nas palavras de Lloyd-Jones:

 

... Deus não somente haverá de eliminar inteiramente o mal e o pecado, como todos os seus resultados, mas também, nesse ínterim, haverá de controlá-los e impor-lhes limites... Deus estabeleceu o presente preceito, o qual insiste que essas questões precisam ser controladas por um certo princípio de igualdade e equidade. Por conseguinte, se um homem chegasse a cegar a outrem, não deveria ser morto por esse motivo. Antes, seria “olho por olho”... O castigo era (deveria ser) sempre equivalente à ofensa, sem jamais excedê-la.

 

04. Vemos então que o objetivo era impor limites razoáveis. Tal lei não visava estimular a vingança, mas “regular”. O ideal é que, pelo menos no caso de pessoa a pessoa não houvesse retaliação. Mas, se essa viesse a existir, que fosse menor ou equivalente, e não mais...

05. Outra coisa importante a observarmos é que esse preceito foi dirigido não às pessoas comuns, mas aos juízes. Eles, os juízes, é que seriam responsáveis por julgar e sentenciar segundo esse preceito. Não podia qualquer pessoa do povo “fazer justiça com as próprias mãos”, mesmo que tal atitude fosse tomada de acordo com esses preceitos (assim como em nosso país – alguém que lhe rouba algo, por exemplo, pode ser sentenciado a ir preso, segundo a lei, se você der queixa; mas não é porque a lei prescreve essa sentença que você tem o direito de construir uma cela em sua casa e prender você mesmo o ladrão nessa cela... é de competência das autoridades constituídas).

06. Vejamos agora qual era o erro dos escribas e fariseus.

 

II. O Erro dos Escribas e Fariseus.

 

01. O erro dos escribas e fariseus era duplo:

a.    Eles ignoravam o fato de que esse preceito se destinava aos juízes, e fizeram dele uma questão de aplicação pessoal. Nas palavras do Pr. Irailton Melo de Souza, tiraram o código legal da mão dos juízes e puseram uma cópia na mão de cada cidadão comum, ou, se preferirmos, fez de cada cidadão comum o seu próprio juiz”. (http://www.jornalpequeno.com.br/2006/6/12/Pagina36100.htm). E com isso eles estavam estabelecendo uma sociedade ávida por fazer justiça com as próprias mãos (pelo menos em alguns casos).

b.    Eles interpretavam o preceito como se tratando mais de um direito sobre o qual eles deveriam insistir do que um princípio regulador das retaliações. E, mais ainda, eles tinham tal preceito como sendo uma exigência social de vingança em favor da honra pessoal, familiar ou tribal.

02. É nesse contexto de erro que aparece Jesus ensinando o que lemos nessa parte do Sermão da montanha. Nas palavras de Mauro Fernando Meister:

 

Quando ele (Jesus) afirma “ouvistes o que foi dito... eu, porém, vos digo...”, não está contradizendo a lei, mas interpretando-a da forma correta e traçando um contraste entre o “espírito da lei” e a interpretação farisaica. O fato é que esta lei era interpretada como um direito de vingança pessoal e não como um princípio de aplicação de pena pelas autoridades devidamente constituídas. Jesus não revoga a Lei de Talião; antes, a confirma... Quanto ao aspecto do perdão, quando questionado por Pedro a respeito de quantas vezes se deve perdoar, o Senhor Jesus deixa claro, tomando a sede de vingança de Lameque em Gn 4.24 (“Sete vezes se tomará vingança de Caim, de Lameque, porém, setenta vezes sete”), que pessoalmente o cristão deve perdoar “até setenta vezes sete” (Mt 18.22).

 

(http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/revista/VOLUME_XII__2007__1/mauro.pdf)

 

03. Por último, consideremos o ensino de Jesus.

 

III. O Ensino de Jesus.

 

01. Depois de se referir à “Lei de Talião”, que apregoa o “olho por olho e dente por dente”, ou o “castigo-espelho”, isto é, punição exatamente igual ao crime, Jesus diz: “Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso...”.

02. O que está envolvido nesse ensino de Jesus?

03. Primeiro precisamos enfatizar que é certo que este não é um ensino para ser posto em prática em toda e qualquer situação. Se assim o fosse, chegaríamos a uma interpretação ridícula e impossível. Não poderíamos ter ou fazer uso, por exemplo, da força policial, porquanto tal força resiste aos perversos. E o mesmo poder-se-ia dizer com respeito às forças armadas, magistrados, juízes, tribunais de justiça... Já pensou?...

04. Dada esta ênfase, devemos levar em conta alguns princípios básicos que nos ajudam a compreender essa afirmação de Jesus. Esses princípios nos são apresentados por Lloyd-Jones em obra aqui usada com fonte de referência, e são os seguintes:

a.    Esse ensino não se destina nem às nações e nem ao mundo em geral e nada tem a ver com o indivíduo que não é discípulo de Jesus Cristo. Isso temos dito desde o início, quando estudávamos as bem-aventuranças, que, conforme vimos, são descrições daqueles que são discípulos de Jesus. Ora, ESSES, devem agir desta maneira; é a ESSES que Jesus se dirige. Esse é o modo de viver cristão, o modo de viver do homem que foi regenerado e transformado pelo poder de Deus.

 

Se solicitarmos de um indivíduo que não nasceu do alto, que não recebeu o Espírito Santo, para que ele viva uma vida cristã, então estaremos virtualmente dizendo que um homem pode justificar-se através de suas próprias obras, e isso é heresia. Assim fazendo, estaríamos sugerindo que se um homem concentrar a força da mente sobre essa particularidade, então poderá viver essa modalidade de vida, em virtude de seus próprios esforços. Ora, isso é contrariar frontalmente o ensino inteiro do Novo Testamento. Nosso Senhor fixou a verdade acerca disso de uma vez para sempre em sua entrevista com Nicodemos. Nicodemos virtualmente estava a ponto de indagar do Senhor: “Que devo fazer para ser semelhante a Ti?” E então, por assim dizer, o Senhor lhe respondeu: “Meu amigo, não pense em termos do que você é capaz de fazer; pois você nada pode fazer; antes, importa-lhe nascer de novo”...

 

Então, reafirmando, trata-se de um ensino não para as nações ou o mundo em geral ou ainda para indivíduo que não é discípulo de Jesus Cristo. Quanto a estes, continua sendo aplicável a “lei de talião”, ou a lei do “olho por olho e dente por dente”, no sentido de ser ela uma lei que, observando o princípio da proporcionalidade, visa refrear o indivíduo no tocante às retaliações, preservando assim a ordem social. E devemos lembrar sempre que tal lei não é de aplicação pessoal e sim através das autoridades constituídas.

 

b.    O segundo princípio é que esse ensino, o de não resistir ao perverso, é para ser aplicado em nossas relações pessoais e não em nossas relações como cidadãos de um país. Se algum discípulo de Jesus, por exemplo, em seu país é integrante das forças armadas, ou da força policial, ou ocupa a posição de magistrado, oficial de justiça, etc, ele deve cumprir o seu papel, que envolve, muitas vezes, resistência aos perversos.

c.    O terceiro princípio, e o último que vamos considerar aqui, é que esse ensino de Jesus, além de versar sobre a atitude do crente para com uma outra pessoa, versa sobre a atitude do crente para consigo mesmo. Ora, por que motivo muitas vezes “contra-atacamos”, de forma pessoal ou indo à justiça contra alguma pessoa? A questão não é o simples contra-ataque ou a simples busca dos recursos legais, e sim “a razão por que eu faço isto”. E a razão é quase sempre o “eu” (o “eu” que foi ferido, o “eu” que foi humilhado, o “eu” que não pode ser defraudado em seus direitos pessoais; o maldito eu que nunca se lembra de que Jesus disse que se alguém quiser ser seu discípulo tem que negar-se a si mesmo, seus “direitos pessoais”, sua própria vida, e tomar a sua cruz e segui-lo).

 

Por que, até mesmo dentro da igreja há muita gente de cara virada um para o outro, incapaz de pedir perdão, incapaz de perdoar, incapaz de aceitar um pedido de perdão, e por aí vai...? Diga-me se não é, em grande parte das vezes, se não na maioria, por causa do eu?

 

“Ouvistes que foi dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos digo: não resistais ao perverso; mas, a qualquer que te ferir na face direita, volta-lhe também a outra; e, ao que quer demandar contigo e tirar-te a túnica, deixa-lhe também a capa. Se alguém te obrigar a andar uma milha, vai com ele duas. Dá a quem te pede e não voltes as costas ao que deseja que lhe emprestes.”

 

Finalizando, por enquanto...

 

01. Creio que já deu para começarmos a ter uma melhor compreensão do significado de não resistir ao perverso (ou às perversidades contra nós)

 

Fontes de consulta para este estudo:

 

- Estudos no Sermão do Monte – Martyn Lloyd-Jones

 

- Olho por Olho – A Lei de Talião no Contexto bíblico: 

http://www.mackenzie.br/fileadmin/Mantenedora/CPAJ/

revista/VOLUME_XII__2007__1/mauro.pdf

 

- Texto do Pr. Irailton Melo de Souza em http://www.jornalpequeno.com.br/2006/6/12/Pagina36100.htm

 

- Wikipédia – a enciclopédia livre

Nenhum comentário:

Postar um comentário

A Chamada à Oração

A CHAMADA À ORAÇÃO   “Orai sem cessar” (1 Ts. 5.17)   1.      A Palavra de Deus é uma Chamada à Oração.   Ø   Orai sem cessar – ...